Fabiana Marques
Após tantos anos ainda temia perder o controle para a ansiedade. Maldito sentimento que teimava vencê-la nas horas mais delicadas, nos momentos em que mais necessitava do absoluto controle de suas emoções.
Através da respiração, fruto dos anos de yoga, tinha aprendido a acalmar-se. Inspira, expira, inspira, expira. Pronto! Já podia ver claramente porque estava decidida a sair daquele lugar em menos de dez minutos. Seria tempo suficiente pra dizer o que precisava ser dito. Olhar nos olhos de Léo pela primeira e última vez depois da separação. Um medo cortante atravessou-lhe o coração. Inspira, expira, inspira...
Ao entrar no saguão do hotel, apressou os passos, mentalizando o monólogo minuciosamente preparado ao longo das últimas semanas. Aceitou o encontro, entrou no jogo de sedução, apenas por saber que não iria até o fim. Olhou para a mão esquerda, fitando a aliança dourada, como para não esquecer. Suspirou.
- Bom dia! Posso ajudá-la?
“Sim, me tire daqui, não me deixe subir” – pensou. – Sim, vou ao quarto 212 – disse.
- Claro senhora, ele está te aguardando. Segundo andar, saindo do elevador à esquerda.
Já no elevador examinou-se discretamente no espelho. Sentia-se bonita, um pouco mais velha e mais magra, mas ainda bonita. Adquirira bom gosto na escolha das roupas, seu penteado também acompanhava as tendências, ainda assim imprimia sua personalidade forte no que usava. Abriu um sorriso, gostava do que via no espelho, ele também iria gostar.
Parou por alguns segundos diante da porta. Dois um dois. Mais um exercício de respiração e tocou a campainha. Léo abriu imediatamente, esperava com um sorriso contagiante e a mesma cara de moleque que tinha lhe encantando anos atrás. Sentiu as pernas amolecerem e as certezas se esvaírem. Então se abraçaram.
Ele a tomou nos braços e por alguns segundos ela hesitou, tentando lembrar a lista extensa de motivos pelos quais não deveria estar ali, mas tudo pareceu muito vazio diante da urgência daquele beijo. Um beijo, daqueles que só eles sabiam dar. Um beijo com gosto de reencontro e desejo. Aspirou seu cheiro e percebeu uma onda de eletricidade se espalhar pelo corpo todo, como um longo arrepio, tomando-lhe as pernas e a consciência. Estava totalmente a mercê dos acontecimentos. Sussurravam frases desconexas. Seus corpos responderam aos impulsos em notável sintonia, como se dançassem uma coreografia ensaiada por muito tempo. E quando o calor e o tesão tornaram-se insuportáveis, ela conseguiu se desvencilhar.
Léo continuou buscando-a, como se aquilo fosse parte da brincadeira, uma peça no jogo de sedução. No entanto, ao fitá-la nos olhos percebeu a intensidade daquele olhar e pressentiu o que estava por vir. Suspirou, como se no fundo soubesse. Finalmente quebrou o silêncio:
- Diga. Pare de me olhar desse jeito!
- Eu tenho um discurso pronto, só não sei se vou conseguir...
- Ai, você me fode. Não íamos congelar tudo lá fora e aproveitar o momento?
- Eu tenho medo.
- Deixa de ser mulherzinha Ana. Você já é um mulherão.
- Você não tem medo?
- Mas medo é bom.
- Isso aqui é tão tentador, não é? Desligar da realidade cruelmente ordinária e viver por algumas horas a intensidade de uma paixão/tesão represada por seis anos.
- Huuum.
- Sentir de novo o gosto da sua boca e do seu corpo. O seu cheiro, o peso do seu corpo sobre o meu. Seus sussurros calientes nos meus ouvidos. Suas mãos me tocando em pontos que já conhecem tão bem. Você dentro de mim, eu dentro de você... Congelar tudo por algumas horas. Somente algumas horas. Parece tão fácil e tão óbvio...
- E não é? Pelo amor de Deus. É só não misturar alhos com bugalhos. Não precisa levar tudo tão a sério. – interrompeu-a com seu linguajar sempre inadequado.
- E como você consegue voltar para sua casa, para a sua mulher ?
- Pra ser sincero, eu acho que para ter um casamento duradouro, tem que “comer fora” de vez em quando. - disse e soltou um risinho malandro.
Sentada no cantinho da cama ela tentava se recompor. Embora tivesse perdido algumas horas de sono imaginando esse encontro, aliás, estremecendo inteira só de imaginar, não iria até o fim. Do que ele estava falando meu Deus? Quem era esse cara que não ouvia uma palavra do que ela dizia?
- Não vai dar Léo. Não vou dar.
- Por quê?
- Há uma lista infindável de motivos, mas o principal deles é que eu não conseguiria cumprir uma prerrogativa básica: não se envolver (ou não misturar alhos com bugalhos como vc diz). Um dos grandes baratos da maturidade é que passamos a nos conhecer melhor e saber nossos limites.
Ele apenas a observava, atônito. Não entendia como uma promissora tarde de sexo delicioso tinha se transformado numa sessão de terapia de casal. E ela continuou:
-Você é meu limite. Apesar de sentir esse tesão quase incontrolável, nunca foi o sexo que me motivou. O que vivi com você (sozinha - eu sei) foi uma história de amor. E essas coisas a gente não apaga. Elas ficam impressas na nossa memória afetiva. Sou muito intensa para passar um dia transando com você até à exaustão, e simplesmente ir embora para minha vida real como se nada tivesse acontecido. Comigo é tudo ou nada
baby.
Levantou-se da cama e pegou a bolsa. Enquanto caminhava em direção a porta, Léo teve um ímpeto de segui-la, mas ela parecia tão decidida e segura, que perdeu o ânimo de confrontá-la. Limitou-se a observá-la partir, resignado.
Ana abriu a porta, olhou para ele pela última vez, ensaiou um sorriso e disse partindo:
- Sorry, I can’t.Marcadores: conto, paixão